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Como a iTunes deixou a Microsoft em pânico

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A iTunes está alcançando hoje a sua maturidade. São 21 anos de uma revolução musical que mudou de forma definitiva a forma em como consumimos a música que mais amamos.

Se o iPod foi um dispositivo amado por muitos usuários, a iTunes foi odiada por toda a indústria fonográfica, principalmente pelas gravadoras, que perderam o poder de controle de mercado.

Mas teve uma empresa em especial que simplesmente se desesperou com o lançamento da iTunes, a ponto de apertar o botão vermelho do “precisamos fazer alguma coisa para parar a Apple”.

Ela mesma: a Microsoft.

 

Uma surpresa que abriu caminhos

 

Em 28 de abril de 2003, Steve Jobs subiu ao palco para apresentar um produto que mudaria para sempre a forma como consumimos música: a iTunes Music Store.

Na época, a indústria fonográfica ainda se agarrava ao modelo tradicional de venda de CDs físicos, mas Jobs vislumbrava um futuro diferente, onde a música seria acessível a todos, a qualquer momento e em qualquer lugar.

E a existência desse artigo em si é a prova cabal de que as visões de Jobs estavam absolutamente corretas neste caso. Foi um caminho sem volta. E até podemos dizer que a iTunes foi a “mãe” do Spotify, em uma analogia com enormes liberdades criativas ou poéticas.

Mas vou falar sobre isso mais adiante neste artigo.

A iTunes Music Store foi um choque para o mercado, e pegou toda a indústria fonográfica de surpresa. É claro que as gravadoras fecharam parcerias com a Apple para que a loja existisse, mas quando Jobs explicou melhor como o serviço iria funcionar (e todo mundo entendeu o buraco que se enfiou), o pânico bateu em muitos executivos.

A ideia de vender músicas por apenas US$ 1, com qualidade aceitável para a época e interface amigável, era revolucionária. A iTunes foi tão revolucionária, que ajudou a “quebrar as pernas” do Napster, que estava consolidado como alternativa para quem queria ouvir músicas de graça.

A Apple pegou todo um mercado consolidado de surpresa, com uma visão inovadora e execução impecável. O golpe foi tão pesado, que até mesmo a Microsoft se surpreendeu com toda a ousadia de Steve Jobs.

 

A reação da Microsoft

Correios eletrônicos internos da Microsoft revelam a reação da empresa à iTunes Music Store. Jim Allchin, um histórico executivo da gigante de Redmond, confessou estar “desconcertado” e reconheceu que a Apple havia “destroçado” a empresa.

Já David Cole, outro importante executivo, admitiu que a Microsoft estava “fragmentada” e que a falta de integração entre as divisões dificultava uma resposta eficaz à inovação da Apple.

Cole aprofundou suas reflexões na troca de e-mails:

“Nós (MSN + Windows) precisamos trazer esse tipo de solução para o mercado. Precisamos de uma super experiência do cliente e serviços para fazer isso. Isso exigirá foco e alinhamento de metas em torno de um serviço que forneça valor direto ao usuário, algo que não temos hoje. Aconteceu com o Mac (um antecessor do iCloud de hoje) em torno de comunicações e armazenamento, a música não deveria ter nos surpreendido. A menos que ambas as equipes alinhem os objetivos de uma maneira diferente, isso continuará acontecendo.”

Aqui, Cole admitia abertamente que tudo o que estava acontecendo diante dos olhos dos executivos da Microsoft era basicamente um problema organizacional e cultural da gigante de Redmond.

Nesse sentido, outra resposta muito esclarecedora foi a de Chris Jones, então vice-presidente da Microsoft:

“Ambas as equipes de ambos os lados queriam que isso se unisse, mas a Apple tem que vir e se mover para que possamos superar os problemas de comunicação e fazer algo. Acho que há uma grande oportunidade em armazenamento, mensagens instantâneas, e-mail, etc., e devemos (fazer isso).”

Na prática, a Microsoft não conseguiu responder a Apple à altura.

Ela bem que tentou seguir os caminhos da gigante de Cupertino, lançando o Microsoft Zune e uma marketplace atrelada ao dispositivo. Mas as iniciativas não entregaram os resultados esperados.

O Zune foi um fracasso comercial (de forma até injusta, pois ele não era um dispositivo horrível – e falarei sobre isso em um artigo futuro), e a Microsoft nunca conseguiu entregar uma loja de músicas que chegasse perto da competência e relevância da iTunes.

Mas não podemos dizer que a gigante de Redmond não aprendeu alguma coisa com a Apple. Do seu jeito, a Microsoft conseguiu entregar pelo menos duas lojas digitais competentes: a Microsoft Store e a Loja Xbox (essa última, muito inspirada na marketplace do Zune).

 

O impacto na indústria da música

A iTunes Music Store produziu um impacto profundo na indústria fonográfica.

Inicialmente resistente à mudança, gravadoras como BMG, EMI, Sony, Universal e Warner foram obrigadas a se adaptar à era digital para sobreviver. O que doeu para alguns executivos mais prepotentes.

Para uma indústria fonográfica que controlava o mercado com mãos de ferro com as mídias físicas (discos de vinil e fitas cassete no começo, e CDs naquele momento), ver uma empresa como a Apple (que nem era desse segmento) reinventar a forma em como todo mundo consumia música era algo que causava desgosto para todas essas empresas.

Como o tempo, a iTunes Music Store convenceu essas empresas de que a venda de músicas por download era o futuro, e que era necessário se adequar às novas demandas do mercado.

Um futuro que só foi modificado (em partes) pelas plataformas de streaming, que tirou ainda mais poder e controle das gravadoras. Hoje, qualquer artista pode gravar, produzir e publicar as suas músicas de forma independente e com 100% dos lucros de vendas e reproduções, o que obrigou as grandes empresas a reinventar o seu papel no mercado.

Hoje, as gravadoras ajudam a levar uma música mais longe, mas não através das rádios ou da MTV (que não toca música faz tempo), mas através de shows e participações em grandes concertos.

E, mesmo assim: dependendo do artista, uma boa empresa de produção de eventos pode ajudar mais do que uma gravadora em alguns casos.

 

Lições e legado da iTunes

A iTunes Music Store deu certo por causa da visão de Steve Jobs sobre a integração entre diferentes divisões da Apple.

Hardware, software e produtos trabalharam juntas para o sucesso da loja, que se aproveitou da tendência de mudança de mercado (lembra que eu falei do Napster um pouco antes) para prosperar e prevalecer.

As mídias físicas estavam condenadas ao desaparecimento (em partes) com a chegada do MP3, e a Apple sabia disso. A iTunes foi a solução certa, que chegou no momento certo.

A loja é um marco histórico da tecnologia e da indústria da música. Sem a iTunes, o Spotify e a própria Apple Music jamais existiriam, pois a plataforma de streaming é uma evolução direta da invenção da Apple.

Parte importante da história do mercado da música foi escrita pela iTunes, que moldou o comportamento do consumidor para o cenário atual, em um legado que é definitivo na vida digital de qualquer pessoa que hoje aproveita os frutos dessa evolução.

A iTunes Music Store fechou as suas portas de forma oficial em 2019, mas seu legado continua vivo, com as lições aprendidas perdurando até hoje.


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