Eu não consigo acreditar que vou falar sobre isso em um artigo no meu blog. E tenho a clara sensação de que alcancei o fundo do poço, ou que estou fazendo isso pelo clickbait.
E… na verdade… estou falando sobre isso apenas e tão somente para obter audiência fácil, e pelo dinheiro que pode vir pela publicidade exibida. E quem se importa com isso? Exatamente: ninguém.
Então, vamos parar de hipocrisia e constrangimentos maiores, já que o assunto deste artigo está despertando sérias preocupações em pais conservadores e professores atormentados com o tipo de alunos adolescentes que precisam encarar nas salas de aula a cada manhã de segunda-feira.
Uma adolescência que está se transformando em função de uma sigla que, quando mencionada, causa gatilhos mentais em qualquer pessoa de bom senso: o NPC.
O que diabos é NPC?
Como este conteúdo também é voltado para adultos que estão vivos neste planeta complexo e problemático chamado Terra a mais tempo do que você é fã do Justin Bieber, é necessário esclarecer o assunto para uma geração que não faz a menor ideia sobre o que leva a sua filha ou o seu neto a se vestir que nem um esquisito e fazer sons e gestos mais estranhos do que espasmos involuntários durante o sono.
NPC é a sigla de Non-Player Character, ou “Personagem Não-Jogável”, em livre tradução. E vou gastar algum tempo para contextualizar esse termo.
Na esmagadora maioria dos casos, quando você joga um jogo de videogame, você controla apenas um personagem. Todos os outros personagens que vão interagir com você são os denominados não-jogáveis.
Ou seja, você até pode falar com eles, ouvir o que eles têm a dizer, brigar com eles, beber uma catuaba com eles, realizar intercursos físicos com eles… mas jamais controlar as suas ações. Isso fica por conta do computador ou da Inteligência Artificial responsável pelas ações do jogo que não passam pelo controle do jogador.
Bom, até aqui está bem fácil de entender, e muitos vão se perguntar: “mas como algo tão inocente pode gerar tanta polêmica”?
E é aqui que eu entro em ação, para jogar um pouco de luz na discussão.
Por que o NPC é “uma ameaça para a sociedade”?
Pais, avós e adultos hipócritas do meu Brasil varonil, boas notícias.
O NPC, como conhecemos, não foi uma criação de um brasileiro, felizmente. O seu filho ou neto importou essa bobagem, copiando produtores de conteúdo asiáticos e norte-americanos. Da mesma forma que boa parte dos artistas que você gostava fez ao plagiar músicas de sucesso de bandas e cantores consagrados ao redor do mundo (e ninguém falou nada sobre isso na época).
Por outro lado, o que chama a atenção no NPC é justamente o fato dele ser um tipo de conteúdo diferente demais dos padrões previamente estabelecidos por essa monstra cheia de dedos e culpa chamada “sociedade”. E, historicamente falando, tudo o que é muito diferente sempre causou estranheza em um mundo dos normais.
E… pra começo de conversa… o que é normal nesse mundo, afinal de contas? Normalizar é, na verdade, estabelecer padrões. Mas o que é padrão para você não será para mim, e vice-versa. Deus me livre ficar preso em relacionamento abusivo e chamar isso de “normal”.
Tá, pode parecer que eu estou passando um pano para esse bando de jovens que perderam a noção do bom senso para se comportarem como autênticos idiotas na frente de uma câmera, só para ganhar mais dinheiro do que eu jamais vou conseguir levantar gerando esse conteúdo. E tudo o que você acabou de ler nos últimos 15 segundos é a prova de que eu não estou relativizando nada.
Até eu, que não me considero a pessoa mais conservadora do planeta, estou preocupado com a saúde mental e a capacidade intelectual de um indivíduo que vai para o TikTok se fantasiar para agradecer o milho que recebe com voz de criança de cinco anos de idade.
Mas… daí a chamar o NPC de “ameaça para a sociedade”?
Será que não estamos exagerando um pouco?
O estranho sempre choca aos olhos dos conservadores
De tempos em tempos, a internet entrega algum absurdo para a diversão de alguns (e desespero de outros tantos). Do trote ao Luís Pareto (o primeiro grande meme da história da internet brasileira) ao Ice Bucket Challenge, passando pelo Harlem Shake e pela banheira de Nutella, sempre tem alguém fazendo alguma coisa incrivelmente estúpida para fazer com que outro idiota abra um sorriso enquanto espera para pagar os boletos do chefe na fila do banco.
Sempre foi assim. E acredito que nunca vai mudar.
Então, os mais preocupados com uma possível sociedade futura em que o normal pode ser bater a cabeça na parede enquanto baba podem ficar um pouco mais tranquilos. Muito provavelmente o NPC é a onda do momento que, para alguns, está virando marola e tende a desaparecer com o passar do tempo.
Mesmo porque o seu principal fomentador decidiu que não quer esse tipo de conteúdo em sua plataforma.
O TikTok está limitando o alcance das lives em NPC para, em um momento posterior, eliminar esse conteúdo de sua plataforma. E está fazendo isso não porque é boazinha ou preocupada com a saúde mental do Enzo ou da Valentina.
O banimento dos NPCs do TikTok está acontecendo pelo principal motivo para que qualquer coisa aconteça neste planeta fétido: o dinheiro.
Os produtores de conteúdo que apostaram nos NPCs estão ganhando quantias generosas de dinheiro todos os dias com essa bobagem (já que sempre vai ter gente ainda mais idiota para financiar a sandice alheia). E o TikTok começou a ter prejuízo ao pagar essa grana toda para esses produtores de conteúdo do absurdo.
Por isso, a plataforma está banindo o NPC para não quebrar as pernas. E mesmo que o TikTok venha a emitir um comunicado informando que está preocupado com a qualidade dos conteúdos publicados na plataforma, tenha em mente que todos os desafios, dancinhas patéticas ou sexistas, e conteúdos que saem do nada e vão para o lugar nenhum (alguns com gosto duvidoso e viés degradante, diga-se de passagem) não chegaram perto de serem excluídos do serviço, exceto quando as violações dos termos de uso são flagrantes.
Ou seja, até mesmo o TikTok age com hipocrisia, tal e como pais e avós que estão chocados com o comportamento dos seus filhos neste momento.
Nem tudo está perdido…
Antes que pais e avós comecem a acender fogueiras para eliminar os próprios filhos e netos (ou que decidam exterminar a existência do Felipe Neto do planeta, já que para alguns deles ele é o culpado de toda a desgraça do mundo), eu digo: nem tudo está perdido.
A febre do NPC está cedendo. Há quem diga que já mede 36,5 graus, permitindo que o adolescente em questão volte para a sala de aula. E sem o TikTok impulsionando essa bobagem, aqueles que apostaram o fim de sua dignidade diante da sociedade não se sentirão tão estimulados a seguir na iniciativa.
E como eu duvido que o YouTube vai copiar o TikTok dessa vez, será uma questão de tempo para que o NFC NPC passe de nova possibilidade de monetização de conteúdo para mais uma fonte de piada e humilhação para as pessoas que perderam o limite do bom senso.
Se bem que… tem o Kwai, que sempre pode se aproveitar do lixo dos outros…
Então… eu não posso te ajudar em tudo. Dei uma ponta de esperança para os adultos mais aflitos, mas deixo um resquício de preocupação para avós mais paranoicos.
Podem me agradecer por nada dessa vez.