Para quem ainda usa o computador todos os dias (ou seja, os velhos blogueiros de tecnologia como eu, os criadores de fake news e os gamers), o cursor do mouse se tornou um elemento fundamental da interação entre o usuário e o sistema operacional.
É através dele que você pode selecionar, arrastar, clicar e executar diversas ações nos mais diferentes softwares. Sem ele, estaríamos digitando comandos de texto, o que impediria os mais jovens em usar o computador, já que a geração Z não sabe mais o que é usar um teclado de PC ou notebook para escrever um currículo para uma vaga de emprego.
Mas… você já parou para prestar atenção na posição do cursor do mouse? Se perguntou por que ele é torto daquele jeito? Por que esse item sempre está apontando para o canto superior esquerdo da tela?
Há uma explicação para isso. E neste post, vou dar respostas sobre essa pergunta que tirou o sono da humanidade por décadas. O que é uma mentira deslavada, mas entendo que ao menos é um tema interessante para um artigo mais informativo.
A origem do cursor do mouse
Para entender por que esse cursor é desse jeito, precisamos primeiro explicar a sua origem. Pois toda história tem um começo.
Tudo começou em 1968, quando o engenheiro Douglas Engelbart apresentou ao público o primeiro protótipo de um dispositivo apontador, chamado de “mouse” (ou “rato”, em livre tradução para o português) por ter um cabo que lembrava a cauda do animal roedor.
E esse é um dos produtos que (felizmente) a Disney não conseguiu patentear ou atrelar ao Mickey Mouse.
Engelbart, que é considerado um dos pais da informática moderna, demonstrou também o conceito de interface gráfica, com janelas, menus e ícones. Bem antes de Bill Gates ou Steve Jobs, e isso acaba com algumas brigas patéticas que testemunhei ao longo das décadas.
O primeiro cursor do mouse era uma simples seta apontando para cima, que se movia conforme o usuário movia o periférico sobre uma superfície plana. Esse design vertical foi inspirado na forma de uma caneta ou de um dedo, que são usados para apontar objetos no mundo real.
O que faz um certo sentido ou razão de ser. Bom, mais ou menos: quando apontamos para algo no mundo real, não conseguimos manter o dedo ou o braço exatamente em linha reta. E (eu nem sei por que vou dizer isso, pois é algo tão óbvio que chega a doer) nós vivemos em um mundo tridimensional, diferente das interfaces de software, que são bidimensionais.
Mas o maior problema do design proposto por Engelbart na época não era a falta de percepção para alinhamento com a realidade prática, mas a tecnologia da época. As telas dos computadores do passado tinham uma resolução muito baixa, o que dificultava a visualização e a precisão do cursor.
Além disso, o cursor vertical ocupava muito espaço na tela, podendo cobrir parte do conteúdo que o usuário queria ver ou selecionar.
Ou seja, a intenção era ótima, mas a aplicação prática desse cursor era péssima. E algo precisava ser feito a respeito.
A inclinação do cursor
Para resolver esses problemas, os designers decidiram inclinar o cursor em 45 graus, mantendo a ponta superior direita como referência. E essa nem é uma mudança tão drástica ou mirabolante, diferente de tantas outras que testemunhamos no mundo da informática, que saíram do nada e nos levaram a lugar algum.
Essa mudança trouxe várias vantagens:
- Aumentou a visibilidade do cursor, pois a inclinação criou um contraste maior entre o cursor e o fundo da tela.
- Melhorou a usabilidade do cursor, pois a inclinação permitiu uma seleção mais precisa dos objetos na tela, especialmente nas bordas e nos cantos.
- Simplificou os cálculos de posição do cursor, pois a inclinação reduziu o número de pixels necessários para desenhar o cursor.
- E o item mais importante (pelo menos para mim): acabou com as crises de TOC dos usuários mais exigentes, que ficaram menos nervosos em usar um elemento na tela que mais atrapalhava do que ajudava.
A inclinação do cursor se tornou um padrão na indústria de informática, sendo adotada por diversos sistemas operacionais e programas. O cursor inclinado também se tornou uma metáfora visual para indicar que o usuário está interagindo com o computador, diferenciando-se de outros símbolos como a seta horizontal ou o dedo indicador.
Foi uma mudança comemorada por todos. Eu me lembro muito bem, pois eu era vivo na época: os principais conflitos globais pararam por uma semana só para comemorar a seta do mouse inclinada em 45 graus.
E desde então, se estabeleceu a paz entre os povos. Bom, mais ou menos.
O processamento visual e as metáforas obsoletas
A inclinação do cursor não é apenas uma questão estética ou funcional, mas também cognitiva. Seu cérebro aceita melhor uma seta inclinada para interagir com elementos gráficos do que uma seta apontada para cima.
Mesmo porque uma seta apontada para cima é uma das metáforas mais grosseiras e sexistas já inventadas.
Segundo estudos de psicologia e neurociência, os seres humanos processam mais facilmente objetos e formas que não estão alinhados verticalmente ou horizontalmente. Isso porque esses objetos se destacam mais no cenário visual, chamando a atenção do observador.
O cursor inclinado se beneficia desse princípio, pois ele se sobressai no meio dos elementos retangulares que compõem a interface gráfica. O cursor inclinado também transmite uma sensação de movimento e dinamismo, contrastando com a rigidez e a estática dos elementos alinhados.
Voltando a falar da parte constrangedora do uso de uma seta para cima, algumas metáforas visuais que foram usadas no passado para representar o cursor se tornaram obsoletas ou inadequadas.
Por exemplo:
- A forma de uma caneta ou de um dedo não faz mais sentido, pois os usuários na época não interagiam com as telas através do toque direto, mas usando dispositivos intermediários como o teclado e o mouse. Tá, eu sei que existe hoje os notebooks conversíveis com telas sensíveis ao toque, mas… convenhamos: a grande maioria ainda prefere usar o mouse ou o touchpad do que ter a tela cheia de marcas de um dedo gorduroso que come Cheetos enquanto desenvolve o próximo Tinder que vai conquistar o mundo.
- A forma de uma mão aberta ou fechada não é mais necessária, pois os usuários não precisam mais “pegar” ou “soltar” os objetos na tela, já que é mais fácil clicar ou arrastar um elemento para copiar ou mover um arquivo de um lugar para outro.
- A forma de uma ampulheta ou de um relógio não é mais útil, pois os usuários não querem ver um símbolo que indica que o computador está ocupado ou demorando para responder. Os sistemas operacionais avançaram muito, e o hardware atual é extremamente potente. Ou seja, nem dá tempo de aparecer uma ampulheta entre uma tarefa e outra. E aqui, eliminamos mais uma fonte de gatilhos emocionais para muitos usuários do passado (graças a Deus).
A assimetria intencional no cursor do Windows
Um dos exemplos mais curiosos da evolução do design do cursor é o caso do cursor do Windows 10. E eu tenho quase certeza que você nem se deu conta disso na época.
Em 2015, quando a Microsoft lançou a nova versão de seu sistema operacional, muitos usuários notaram que o cursor tinha uma pequena assimetria: a ponta superior direita estava um pixel mais baixa do que a ponta inferior esquerda.
Sim, eu sei: é uma diferença minúscula o suficiente para passar batido por você ou por qualquer outra pessoa normal que não tem tempo na vida para procurar um detalhe tão insignificante. Porém, isso é relevante o suficiente para virar um artigo neste site. Logo, eu agradeço aos desocupados por este conteúdo existir.
Essa assimetria gerou muitas críticas e reclamações, pois muitos usuários acharam que se tratava de um erro ou de uma falha de qualidade. Afinal de contas, estamos tão acostumados com os erros da Microsoft no Windows, que era muito mais fácil jogar pedradas nela antes de descobrir os reais motivos para essa decisão
No entanto, a Microsoft explicou que a assimetria era intencional e fazia parte do design do cursor. Segundo o time de designers responsáveis pelo cursor do Windows 10, a assimetria foi criada para gerar um equilíbrio óptico, e não geométrico.
Ou seja, a assimetria foi necessária para que o cursor parecesse simétrico aos olhos dos usuários, mesmo que não fosse matematicamente simétrico. É quase uma ilusão de ótica que o seu cérebro vai entender, mas você, não.
O equilíbrio óptico nem sempre coincide com o equilíbrio geométrico, pois a percepção visual humana é influenciada por vários fatores, como o contraste, a luminosidade, a cor e a forma dos objetos. Por isso, às vezes é preciso criar desigualdades geométricas para alcançar igualdades visuais.
Esse não é o único desequilíbrio ótico no design relacionado ao mundo da tecnologia. Outras empresas como Google e Nintendo também adotam essa abordagem em seus produtos e logotipos, com o objetivo de criar imagens agradáveis e harmoniosas.
Mesmo que isso gere um certo TOC em alguns usuários mais atentos aos detalhes.
Conclusão
Está tudo certo com o cursor do mouse. Ele foi feito desse jeito para que você entenda que este elemento existe para você interagir com o sistema operacional, evitando a confusão com outros elementos gráficos da plataforma.
Nem sempre o cursor do mouse recebe essa atenção toda, e poucos sites escreveram algo sobre a sua história. E voltar ao passado revelou uma narrativa minimamente interessante sobre um elemento que está diretamente relacionado com a evolução da informática, do design e da cognição humana.
Sem o cursor do mouse, a interação com os computadores seria algo bem diferente. E eu teria enormes dificuldades em produzir esse conteúdo.
Do início ao fim.