Hollywood já utiliza inteligência artificial há muito tempo, mas mantém essa informação em sigilo estratégico. A indústria cinematográfica americana desenvolveu uma rede robusta de cem estúdios que trabalham exclusivamente com tecnologias de IA, operando de forma relativamente reservada para evitar controvérsias públicas.
A Asteria Film, cofundada pela atriz Natasha Lyonne, planeja dirigir o primeiro filme gerado inteiramente por inteligência artificial. O estúdio se posiciona como “ético”, utilizando apenas material licenciado para treinar suas ferramentas de geração de imagens.
Diretores renomados firmaram parcerias estratégicas com empresas de IA. Darren Aronofsky fechou acordo com a DeepMind do Google, enquanto James Cameron se associou à Stability AI.
O principal argumento? É mais barato
Especialistas estimam economias substanciais com o uso de IA, e a conta nem é tão difícil de fechar neste caso.
As produções tradicionais podem reduzir custos entre 20% e 50%, enquanto projetos com forte apoio de IA alcançam até 90% de economia, especialmente em efeitos visuais. A indústria americana de cinema e TV pode economizar 15 bilhões de dólares entre 2024 e 2026 apenas em produção e pós-produção.
Na última década, a IA começou auxiliando em aspectos específicos como otimização de cronogramas, alocação de recursos e gestão de equipes. No departamento de edição, automatizava seleção de fotos e sincronização de áudio e vídeo.
Ferramentas especializadas por etapa de produção
- Pré-produção: O LTX Studio realiza pré-produção completa, enquanto ferramentas especializadas como Filmustage planejam filmes, Boords criam storyboards e Largo.ai analisa impacto potencial.
- Filmagem: Inclui controle de câmeras e drones, iluminação inteligente e cenários virtuais com o Stagecraft, que gera ambientes em tempo real integrando atores reais e fundos digitais.
- Pós-produção: DeepMotion e Ziva Dynamics dominam efeitos e animação. Outras ferramentas incluem Colourlab.Ai para correção de cores, DeepDub para dublagem com sincronização labial e Amper Music para trilhas sonoras em produções de menor orçamento.
Acordos trabalhistas limitam o uso
As greves de 2023-2024 dos sindicatos WGA (roteiristas) e SAG-AFTRA (atores) contra a AMPTP resultaram em acordos restritivos. Produtoras não podem gerar roteiros sem participação de roteiristas ou replicar imagens de atores sem permissão.
O uso como ferramenta auxiliar é permitido, desde que haja supervisão humana sindicalizada. E para os outros postos de trabalho que não estão diretamente relacionados com a produção dos filmes e programas de TV, as chances de demissão em massa são enormes.
Lyonne defende que artistas devem liderar o processo antes que se torne norma industrial. Propõe um “Dogma 95 para a era da IA”, priorizando criadores sobre os recursos técnicos.
E diante das novas tecnologias de criação de conteúdo que foram implementadas recentemente pelas principais plataformas de inteligência artificial, tentar impedir que os recursos sejam utilizados de alguma forma pelos grandes estúdios chega a ser algo inútil.
Apesar da cautela devido à má percepção pública, a questão não é se a IA invadirá Hollywood, mas quando isso acontecerá de forma massiva, o que é estimado para 2026-2027.
O que é o “Dogma 95”?
O “Dogma 95” foi um movimento cinematográfico criado em 1995 pelos diretores dinamarqueses Lars von Trier e Thomas Vinterberg. O manifesto estabeleceu regras rígidas para despir o cinema de artifícios técnicos e excessos tecnológicos, focando na pureza narrativa e na autenticidade artística.
As regras do Dogma 95 incluíam filmagens apenas com câmeras de mão, som direto sem música adicionada posteriormente, iluminação natural exclusivamente, cenários reais sem construções artificiais e proibição de efeitos especiais ou filtros. O objetivo era forçar os cineastas a se concentrarem na história e nas performances, eliminando distrações tecnológicas.
Quando Natasha Lyonne menciona um “Dogma 95 para a era da IA”, ela propõe criar um movimento similar que estabeleça princípios éticos e criativos para o uso da inteligência artificial no cinema. A ideia seria definir regras claras que garantam que os artistas mantenham controle criativo sobre suas obras, mesmo utilizando ferramentas de IA.
Esta proposta sugere que, assim como o Dogma 95 reagiu contra os excessos tecnológicos dos anos 1990, um novo manifesto deveria emergir para evitar que a IA domine completamente o processo criativo. Lyonne defende que os cineastas estabeleçam limites e diretrizes antes que a indústria imponha suas próprias regras, priorizando eficiência e lucro sobre expressão artística.
O paralelo é especialmente relevante porque ambos os movimentos questionam o papel da tecnologia na arte cinematográfica, buscando preservar a essência humana da criação artística em meio a avanços tecnológicos disruptivos.
Via Vulture