A lista de indicados ao Oscar 2025 é bem fácil de ser encontrada, e praticamente todos os sites publicaram ao longo das últimas 24 horas. Mas falar sobre as surpresas, os esnobados, os injustiçados e os esquecidos na lista de indicados é um exercício criativo bem mais interessante.
O fato de “Emilia Pérez” receber 13 indicações e “O Brutalista” e “Wicked” contarem com 10 menções ao longo das categorias resulta, de forma quase imediata, em algumas injustiças e contradições na lista divulgada em 23 de janeiro de 2025.
Tudo bem que para nós, brasileiros, a lista de indicados ao Oscar é surpreendentemente positiva. Mas não deu para agradar a todos. E vamos falar a partir de agora sobre algo além da nossa felicidade.
As surpresas
Jeremy Strong recebe sua primeira indicação ao Oscar
O astro de “Sucession” arrebentou em “O Aprendiz”, interpretando Roy Cohn. O filme lutou para estrear nos Estados Unidos, e não impediu Donald Trump de iniciar um segundo império de terror. Mas considerando o contexto político da premiação, o desempenho de Strong chamou a atenção o suficiente para colocar o filme (e o ator) no radar.
“A Substância” indicado como Melhor Filme
Não foi tanta surpresa para mim, mas muitos foram pegos no contrapé com essa indicação. É raro ver um filme de terror recebendo o reconhecimento no Oscar, mas o discurso de Demi Moore no Globo de Ouro e sua performance no filme pesam a favor neste caso. Fato é que, antes de 2025, essa indicação era pouco provável.
Sebastian Stan indicado por “O Aprendiz”
Uma combinação dos cenários de Jeremy Strong e “A Substância” neste caso. Sebastian Stan interpretou uma controversa versão de Donald Trump que, segundo o próprio ator, foi o papel mais difícil de sua carreira. Mesmo com a baixa visibilidade do filme nos EUA, o ator conquista essa indicação como reconhecimento do seu esforço. Seu comprometimento como papel foi reconhecido pela Academia.
“Better Man” indicado em Efeitos Visuais
O filme autobiográfico do cantor britânico Robbie Wlilliams foi um enorme fracasso na bilheteria dos EUA, mas aparentemente agradou os membros da Academia, a ponto de receber ao menos uma menção na lista dos indicados.
Os macacos
Já que estamos falando em Efeitos Visuais, é correto dizer que 2025 foi o ano dos macacos no Oscar. Além de “Better Man”, “Wild” e “Planeta dos Macacos: O Reinado” foram indicados nessa categoria e, coincidência ou não, contam com o primata como elemento comum.
“O Aprendiz” recebendo o reconhecimento
De novo: é um filme que muitos votantes da Academia simplesmente se recusaram a reconhecer a sua existência no planeta Terra (por motivos óbvios) e, mesmo assim, o filme conseguiu indicações nas categorias de atuação, o que sempre dá visibilidade para o longa.
Yura Borisov
Você muito provavelmente não sabe quem é esse cara, mas muitos dentro do meio do cinema enxergam a indicação de Yura Borisov na categoria Melhor Ator Coadjuvante por “Anora” como algo muito justo. Ele é parte do coração do filme, e isso fez com que muitos críticos o enxerguem como um ator de futuro promissor.
Os esnobados
Angelina Jolie, por “Maria”
Muitos davam como certa a indicação ao Oscar de Angelina Jolie, por sua muito elogiada versão cinematográfica da cantora Maria Callas. Porém, ela agora encabeça uma lista de, pelo menos, quatro grandes atrizes que ficaram de fora da lista final da premiação este ano.
Nicole Kidman, por “Babygirl”
Kidman venceu o prêmio de Melhor Atriz no Festival de Veneza e o mesmo prêmio no National Board of Reviews, mas após as derrotas no Screen Actors Guild e no BAFTAs, a atriz perdeu impulso para o Oscar 2025, mesmo mandando muito bem no papel de uma CEO de tecnologia sombria e implacável.
Selena Gomez, por “Emilia Pérez”
Aqui, tendo a discordar um pouco, e faço a menção muito por causa dos fãs da cantora. O nome mais famoso do elenco de “Emilia Pérez” foi esquecido pela Academia. E neste caso, nem dá para dizer que os velhos votantes não gostam de cantoras pop porque, afinal de contas… Ariana Grande foi indicada na mesma categoria por “Wicked”. Para um filme que recebeu nada menos que 13 indicações, dava para eventualmente esperar uma certa dose de boa vontade adicional para a ex de Justin Bieber.
“Gladiador II” fora de Melhor Filme (e Denzel Washington esquecido)
Um combo para facilitar a nossa vida. A continuação para o filme vencedor do Oscar dirigido por Ridley Scott que ninguém pediu só foi indicado como Melhor Figurino, e mesmo com a boa bilheteria e a sempre competente performance de Denzel Washington, o longa não alçou voos maiores na principal premiação do cinema.
Denis Villeneuve como Melhor Diretor por “Duna: Parte II”
Esse aí está sofrendo do efeito “O Senhor dos Aneis: As Duas Torres”. Já não foi indicado no primeiro “Duna”, mas alguns sinais apontavam para uma possível menção pela segunda parte da saga. Mas como todo mundo sabe que teremos um terceiro filme para concluir a história, os membros da Academia decidiram esperar para premiar a obra completa. E Denis que espere por isso.
Edward Berger como Melhor Diretor por “Conclave”
O polêmico “Conclave” recebeu nada menos que oito indicações ao Oscar 2025, incluindo Melhor Filme. Mas Edward Berger não foi indicado pelo seu trabalho na direção do filme. Não será a primeira vez que isso acontece. E não será a última.
Pamela Anderson, por “The Last Showgirl”
Anderson foi muito elogiada por sua performance de Shelly Gardner, mostrando um lado de atuação que, até então, estava escondido nela. Hollywood adora um comeback, e a prova disso foi sua indicação ao Globo de Ouro. Mas suas expectativas para o Oscar caíram por terra, já que a categoria de Melhor Atriz só suporta cinco indicadas.
Daniel Craig, por “Queer”
Muitos acreditavam que, apesar do pouco tempo de exibição nos Estados Unidos, o filme que traz o ex-James Bond no papel do ator William Lee receberia um destaque maior no Oscar. Ainda mais com a indicação de Craig ao Globo de Ouro e a vitória como Melhor Ator no National Board of Review. Nada disso foi suficiente.
Clarence Maclin, por “Sing Sing”
Esse filme teve seis longos meses para fazer o seu nome para uma indicação, mas seu retorno na bilheteria foi modesto. Ainda assim, recebeu três indicações ao Oscar, mas Clarence Maclin, favorito para Melhor Ator Coadjuvante, ficou de fora da lista final dos indicados. Ao menso Colman Domingo recebeu a sua indicação como Melhor Ator.
A trilha sonora de “Rivais”
A trilha sonora propulsora de Trent Reznor e Atticus Ross foi um sucesso com o público, e foi muito importante para dar ritmo ao filme. E mesmo com elogios dos membros da Academia no passado por “Soul” e “A Rede Social”, a dupla não foi lembrada para uma indicação em 2025.
Margaret Qualley, por “A Substância”
Se Demi Moore brilhou em “A Substância”, parte do êxito está na atuação extremamente exigente (nos aspectos físicos) de Margaret Qualley como a oponente da protagonista. Mas isso não foi levado em consideração pelos membros da Academia.
“Wicked” de fora para Melhor Roteiro Adaptado
Pode parecer choro de insatisfeito, já que “Wicked” recebeu 10 indicações, incluindo em categorias importantes. Mas fato é que o filme simplesmente não poderia competir nessa categoria por questões técnicas. Algo me diz que, se pudesse, seria indicado nessa categoria também.
Joe Walker, por “Duna: Parte II”
O ator estava nas listas de todas as principais previsões de jornalistas e especialistas, e foi indicado no American Cinema Editors Awards e no BAFTA Film Awards. E venceu o Oscar pelo primeiro filme da saga. O que aconteceu aqui, Academia?
”Duna: Parte II” (como um todo)
O filme foi aclamando por público e crítica, foi um campeão de bilheteria, mas… de novo: sofre dos efeitos da “Síndrome do Senhor dos Anéis: As Duas Torres”. Tudo isso para encher o terceiro filme da saga de indicações (e quem leu o livro que dá base para a história dos filmes afirma que as chances disso acontecer são bem baixas).
“Sing Sing” (como um todo)
Um filme da A24 se dando mal no Oscar? Pois é… isso aconteceu com “Sing Sing’, um drama prisional com a música como plano de fundo. Mesmo indicado como Melhor Roteiro Original, Melor Canção Original e Melhor Ator, há quem diga que foi muito pouco para um filme desse porte.
“Nosferatu” (como um todo)
Terror e ficção científica: dois gêneros historicamente rejeitados pelos membros da Academia (exceto é claro que o seu filme seja “A Substância”). “Nosferatu” foi lembrado nas categorias técnicas, alcançando quatro indicações. Mas não ter chance alguma nas categorias de atuação e até mesmo em Melhor Filme deixam aquela impressão que o filme só existiu e nada mais.
As animações da Disney em 2024
As animações independentes mais uma vez mandaram na lista de indicados de sua categoria, o que é algo sempre muito positivo. Mas quem pagou o pato dessa vez foi a Disney, que só se salvou com Divertida Mente 2 porque, convenhamos, carrega o prestígio do primeiro filme. “Moana 2” e “Mufasa: O Rei Leão” não teriam a menor chance de figurarem ao lado de “Robô Selvagem”.
“Tudo Que Imaginamos Como Luz”
Aqui, a culpa não foi da Academia de Hollywood. Quem fez a merda aqui foi a Índia, que simplesmente ignorou “Tudo Que Imaginamos Como Luz” como seu filme elegível a indicações para o Oscar. Deixa um gosto agridoce ver o filme de Pago Palho vencer o Globo de Ouro e ficar de fora da principal premiação do cinema porque quem escolheu não teve a sensibilidade de entender que este é um dos filmes mais especiais de 2024. Por outro lado, melhor para “Ainda Estou Aqui”, pois é um forte adversário a menos em Melhor Filme Internacional.
“The Last Showgirl”
Tudo levava a crer que o filme ajudaria Pamela Anderson a restabelecer sua carreira como atriz e, de fato, o longa conseguiu isso. Só que nem ela, nem Jamie Lee Curtis, e muito menos o longa foram reconhecidos pela Academia, e agora o filme parece estar destinado ao ostracismo.
“Rivais”
Talvez o maior esnobado do Oscar 2025 seja “Rivais”. Em abril, o filme de Luca Guadagnino era um dos mais comentados em todo o mundo, e a impressão que ficou é que esse seria um indicado certo nas principais categorias. Porém… se nem Zendaya conseguiu ser indicada, é sinal que o longa só existiu e nada mais.
Não estou me esquecendo de nada?
Ah, sim… claro… vamos ao que interessa para os brasileiros.
E “Ainda Estou Aqui”?
Uma grata surpresa em alguns aspectos, mas apenas confirmações de algo que eu já sabia que iria acontecer.
Eu disse ANTES DE TUDO ISSO ACONTECER que Fernanda Torres seria indicada a Melhor Atriz e “Ainda Estou Aqui” estaria entre os finalistas em Melhor Filme Internacional no Oscar 2025. E afirmei isso por pura convicção, e não por pachequismo.
Para muitos, a vitória de Torres no Globo de Ouro foi vista como uma surpresa, e é preciso compreender o contexto para entender essa impressão.
A atriz brasileira está completamente fora do radar de Hollywood, diferente de Nicole Kidman, Tilda Swinton, Kate Winslet, Pamela Anderson e Angelina Jolie.
Veja a lista de gigantescas e reconhecidas atrizes que Fernanda Torres superou para estar na lista de finalistas para Melhor Atriz do Oscar. Só por isso, essa indicação é uma vitória gigantesca.
A vitória de Torres no Globo de Ouro deu impulso e visibilidade para o filme, que só agora estreou no grande circuito norte-americano de cinemas. E fez isso, quebrando recordes por lá.
Sem falar em todo o engajamento do povo brasileiro ao filme, inundando as redes sociais das premiações com postagens, comentários, elogios e até ameaças aos adversários e críticos.
Fernanda Torres, mesmo não sendo a favorita a vencer (para mim, Demi Moore deve levar, o que não me impede de torcer pela brasileira), se tornou uma opção a sério para levar como Melhor Atriz, ainda mais se considerarmos o histórico do próprio Oscar.
Com uma Academia um pouco mais diversa nos votantes, e com muitos deles se lembrando de tudo o que aconteceu em 1999, é possível que o nome de Fernanda ganhe ainda mais força nesse “segundo turno” de votações para o Oscar.
Sem falar que o filme de Walter Salles entrou no radar de vez, superando as expectativas com essa inédita indicação para Melhor Filme.
“Ainda Estou Aqui” é visto como uma das grandes surpresas na lista de indicados. E, sendo bem realista, vencer uma das três categorias (não importa qual) seria um sonho a ser realizado.
Se bem que… eu tenho sangue nos lábios, e quero ver Fernanda Torres vingando Fernanda Montenegro.
Quem sabe as próximas semanas ajudam ao nosso brasileirinho contra o mundo, ainda mais com todas as polêmicas que “Emilia Pérez” se envolveu recentemente. Não podemos nos esquecer que o filme francês sobre o tráfico de drogas mexicano interpretado por atrizes norte-americanas é da Netflix, e a Academia tem um ranço enorme da plataforma de streaming.
Olhando para o cenário geral, dá sim para torcer por “Ainda Estou Aqui”. Dá para sentir aquela esperança de que, finalmente, o Oscar vem.
Tal e como é torcer por uma Copa do Mundo do Brasil.
Mas… já vencemos. Esse filme já venceu, porque é um filme para nós, brasileiros.
Somos vencedores, pois a história de Eunice Paiva foi contada.
E nunca mais será esquecida.