As gravadoras da indústria fonográfica, que são representadas nos Estados Unidos pela RIAA (Recording Industry Association of America) são, na verdade, muito medrosas. Passaram décadas com medo da pirataria e de todas as tecnologias de compartilhamento de músicas, como o Napster e o BitTorrent. E sempre declararam que essas ferramentas marcariam o fim da indústria da música como um todo.
Mas não perceberam que, por outro lado, uma ameaça ainda maior estava surgindo. E, dessa vez, vai ser difícil controlar os seus “criadores”. Até porque a RIAA não pode ser considerada a dona da música gerada por Inteligência Artificial.
Ou seja, no futuro, podemos ter música de forma ilimitada, com criação livre e sem uma gravadora para controlar isso.
Olha só como isso é interessante!
O que está acontecendo?
A RIAA decidiu colocar no mesmo grupo de “ameaças” da indústria que já contava com sites de Torrents ou serviços que “ripam” as músicas em formato digital pelas mais diferentes vias (como, por exemplo, a conversão dos vídeos do YouTube no formato .MP3) os serviços de inteligência artificial que estão mixando as músicas originais para criar uma nova canção completamente diferente, original e livre dos direitos de autor, com resultados muito similares ao original.
Mais uma vez, é a tecnologia driblando a RIAA para oferecer música de graça para todos. E, dessa vez, estão pegando um enorme vácuo legal que pode fugir completamente do controle das gravadoras se o que hoje é considerado ainda “um experimento” se transformar em tendência.
De acordo com os responsáveis da RIAA (todos em posição fetal, em um canto escuro, chorando e gemendo, com medo):
“Existem serviços online que, supostamente utilizando inteligência artificial (IA), extraem, ou melhor, copiam as vozes, os instrumentos, ou parte dos instrumentos de uma gravação sonora, e/ou geram, masterizam ou remixar uma gravação para ser muito semelhante ou quase tão boa quanto as faixas de referência de artistas de gravação de som selecionados e conhecidos.”
O problema aqui é a combinação das músicas de referência para criar a nova canção. Quem é que tem o direito sobre essa nova música? E, para piorar, os resultados são tão bons, que dá mesmo para confundir com os artistas originais.
Outra questão importante está nos softwares que removem as vozes dos intérpretes originais para oferecer versões incidentais das canções para outras finalidades. Seja para que as pessoas possam ter um karaokê em casa, seja para incluir uma voz de outro cantor modificada por computador ou para qualquer outra finalidade alheia aos direitos originais do registro fonográfico.
Para a RIAA, os serviços online de mixagem são utilizados para criar versões alternativas das canções originais sem a permissão dos seus autores. Para todos os casos, a entidade interpreta que o resultado final são cópias não autorizadas ou trabalhos derivados não autorizados das músicas originais, seus intérpretes e detentores dos direitos.
O debate está servido
De novo, estamos diante do debate dos direitos autorais dos artistas que, de forma legítima, merecem receber os royalties dos seus respectivos trabalhos. O problema é que, durante muito tempo, as gravadoras ditaram as regras sozinhas, sem oferecer o valor merecido para os artistas, e cobrando preços absurdos dos fãs de música por CDs e downloads de álbuns em formato digital ou canções em separado.
Ao longo dos últimos 25 anos (pelo menos), o jogo virou, e o cenário mudou bastante. O consumo de música está muito mais democrático, e não apenas porque o Napster ou o BitTorrent começaram a cultura de compartilhamento de música digital de graça na internet. Iniciativas como Apple Music e Spotify deixaram o jogo muito mais dinâmico, e retiraram o poder das gravadoras em determinar o que as pessoas devem ouvir e – a pior parte – cobrar o que quiser por isso.
A RIAA está, de novo, desesperada, porque a sua grande inimiga do último quarto de século deu as caras novamente. A boa e velha tecnologia (a nossa grande amiga) surge novamente para oferecer alternativas para os usuários, ameaçando mais uma vez a tentativa patética em restabelecer um controle que não está mais nas mãos das grandes empresas da indústria musical.
Por outro lado, o mundo da música agora entra no mesmo debate que a TV e o mundo das artes estão discutindo a algum tempo. É a sua versão das deepfakes, com a diferença que os artistas prejudicados não necessariamente terão as suas respectivas imagens e reputações afetadas pelas canções mixadas.
Só vão ficar com menos dinheiro no bolso mesmo.